Palavra do Pereira
Cuidar bem das nossas crianças
Este artigo foi publicado no jornal Guarulhos Hoje, dia 22 de junho de 2016.
José Pereira dos Santos |
Sempre admirei pessoas, entidades e governantes que protegem a infância e combatem a exploração. Fui menino muito pobre e desde pequeno tive de trabalhar em lavouras e carvoarias. Corri riscos graves e, certamente, muitos dos pequenos trabalhadores do meu tempo contraíram doenças ou sofreram mutilações.
Há muitas maneiras de se avaliar o padrão civilizatório de um povo. Com certeza, a maneira com que as crianças são tratadas explica muito sobre o padrão cultural, econômico e moral das Nações.
Há quem pense que o zelo com a infância é um cuidado recente, até porque o Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil só foi instituído pela ONU em 2002 - aliás, 12 de junho marca esse Dia Mundial. Não é verdade. O antropólogo Darcy Ribeiro viveu duas décadas entre os índios do Xingu, nos anos 40 e 50. Ele conta num de seus livros: “Nunca vi uma criança ser molestada ou apanhar”.
A Unicef contabiliza em torno de 170 milhões de crianças trabalhando pelo mundo. Boa parte, diz a entidade, sofre sequelas do trabalho exaustivo, pesado ou degradante. Não precisamos ir longe. Nos últimos anos, o Ministério do Trabalho aprofundou as fiscalizações sobre exploração infantil e constatou que a prática persiste em nosso País, nos lugares afastados e também, infelizmente, em grandes centros urbanos.
Ainda recentemente, o ministério encontrou crianças em situação análoga à escravidão em oficinas de costura de uma marca famosa, presente em shopping elegantes. O cidadão que compra uma peça de roupa, pagando caro, não tem ideia de que seu gesto, involuntariamente, está estimulando o trabalho degradante.
Penso que não basta criticar governos ou patrões exploradores de crianças. É preciso criar uma cultura severa em relação a essa prática. Para tanto, os meios de comunicação de massa deveriam se engajar, permanentemente, em campanhas esclarecedoras ou de denúncias. Até porque a mídia, não à toa, é chamada de comunicação social. Portanto, tem responsabilidade e papel a desempenhar.
Estou aqui tratando de um assunto que conheço na prática, pela condição de menino trabalhador que fui e como criador de um instituto, há 14 anos. É o Instituto Cultural e Esportivo Meu Futuro, que beneficia 160 crianças no Parque Primavera, em Guarulhos. Nesses anos todos, várias turmas passaram pelo Instituto, que também assiste as famílias. Muitos jovens aprenderam uma profissão e encontraram o primeiro emprego.
Em nosso Clube, mantemos uma escolinha de futebol, que, além da prática esportiva, ajudam na socialização dos meninos. O esporte faz bem à saúde e educa, pois só podem participar garotos que frequentam escolas, regularmente, e apresentam boas notas.
Com isso, não resolvemos os problemas da infância em nossa cidade. Mas damos uma contribuição efetiva pela dignidade das crianças, afastando-as de exploradores e do vício. Não somos os únicos a fazer isso. Pelo contrário. Muita gente se dedica a essa atividade. Tais iniciativas precisam ser conhecidas e valorizadas. Até porque é o bom exemplo que constrói.
Brizola - “Devemos investir nas crianças para que as novas gerações tenham a coragem para fazer aquilo que não fizemos.”