Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos e Região
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Ele foi vaqueiro na pequena Tauá (interior cearense), onde nasceu em 30 de janeiro de 1930. Veio para São Paulo aos 21 anos de idade. Aqui fez sua vida: foi metalúrgico, lutou por sua categoria, presidiu o Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos e Região por quatro mandados, entrou para a política, candidatou-se a deputado estadual em 1997 e se elegeu vereador, com mandato de 2000 a 2004.

Sua voz continua vigorosa, sua presença continua imponente, e sua linguagem continua direta, cearense, pura. Ele é de opinião que “não importam os erros de português, o importante é você dar o recado que todo trabalhador entenda”.

Este é Francisco Cardoso Filho, o “Chicão”, que tem muitas histórias pra contar, e sonhos ainda a realizar no alto dos seus 81 anos. Nada o impede de continuar trabalhando. Todas as manhãs, lá está ele em seu posto numa agência de empregos, buscando colocar companheiros no mercado de trabalho. “Eu nunca vou desistir de ajudar quem precisa”, diz.

Viúvo de Dona Amélia, que faleceu em 2003, tem três filhas e três netas. “Qual é o homem que não quer um filho? Deus me recompensou com seis mulheres maravilhosas”.

Vida - Em Tauá, Chicão começou a montar em cavalo com apenas três anos de idade. Foi fácil pra ele, então, ter sua primeira profissão ainda na adolescência. “Quase todos os meus amigos se tornaram vaqueiros no sertão bravo, e eu não fui diferente. Qualquer carroceiro naquela época, e na minha região, andava com o bolso cheio de dinheiro. Não era muito, mas o suficiente para superar toda a miséria da região”, comenta.

Tocava boiada por dois ou três dias até o local de embarque da manada. Começou a pensar grande aos 16 anos. “Meu sonho era vir pro Sudeste e fazer minha vida. Apesar de trabalhar, todo dinheiro que ganhava deixava em casa pra minha família. Meu pai controlava tudo, e era difícil arranjar dinheiro com ele até para ir ao forró no final de semana”, lembra.

Seu pai administrava a fazenda em que a família morava em Tauá. Com a morte da mulher, o pai de Chicão se casou com outra, de 20 anos. “Era minha amiga de infância, que virou minha madrasta”, relembra.

Chicão disse que nunca passou necessidade, como a maioria dos seus conterrâneos, mas tinha seu sonho de independência. “Vir pra São Paulo era um objetivo que não saía de minha cabeça, e que somente realizei quando fiz 21 anos”, recorda.

Mudança - Completada a maioridade, em um dia de 1951 Chicão abandonou tudo em Tauá e iniciou uma longa jornada até São Paulo.

Ele conta a história: “Deixei tudo pra trás, inclusive meu pai, e vim tentar a sorte na cidade grande. Vendi meu burro arriado (com sela e tudo) por 1.200 réis, peguei o pau de arara em Missão Velha (divisa de Pernambuco) e, com meu primo, iniciei a jornada. Ficamos três dias em Salgueiro de Pernambuco. Foram oito dias de viagem, no total, das 5 às 22 horas. Quem não tinha dinheiro dormia no próprio pau de arara. Eu e meu primo, com o dinheiro da venda do burro, conseguimos dormir em pousada, tomar banho e comer decentemente”.

No Brás - Em 28 de novembro de 1951, o migrante cearense desembarcou no Brás. Ele conta: “Fomos direto pra casa de meu primo, irmão do que viajou comigo, que era motorneiro de bonde e morava no Belenzinho. Em apenas três dias, arrumei meu primeiro emprego em São Paulo, como servente de pedreiro em uma obra na rua Abolição, no Centro da Capital. Exerci essa profissão por quatro anos. Depois, trabalhei mais de um ano em uma churrascaria na avenida São João, onde fazia lanches; fui ajudante de caminhão por seis meses na Caracu; fiquei um mês parado até que, em 1957, entrei na Goodyear como operador de máquina”.

Começou, aí, a vida de operário industrial de Chicão. “Entrei, depois, em uma fábrica de prego que pertencia à família Ermírio de Moraes. Fiquei até 1962, quando consegui emprego naquela que viria a ser, hoje, a Cummins do Brasil, trabalhando na linha de montagem de motores”.

Sindicalista - Como metalúrgico, Chicão ficou sócio do Sindicato em 1966 e já em 1968 foi eleito suplente da diretoria, iniciando uma longa, sólida e produtiva carreira sindical. Com boa oratória, somente deixou a diretoria em 2000, quando se elegeu vereador em Guarulhos. No Sindicato, foi diretor, secretário-geral, vice-presidente e, em 1987, assumiu a presidência.

Ditadura - São muitas histórias, mas Francisco Cardoso Filho lembra de uma especial: “Um dia tive medo. Em 1978, quando era vice-presidente, em plena ditadura militar e quando Lula (Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República) começou com as greves no ABC, fui preso e levado para o extinto Dops (órgão repressor do governo) na rua Brigadeiro Tobias, em São Paulo. Fazíamos uma paralisação na VDO (atual Continental) e todos os sindicalistas foram presos. Passei por maus bocados, mas no final valeu a pena. Depois dessa, fui preso mais duas vezes, sempre buscando algo melhor para nossos companheiros metalúrgicos”.

Organização - Chicão salienta a forma de fazer sindicalismo: “Em todo meu tempo de dirigente, sempre fiz greves pacíficas. Só fazia as ações se tivesse total apoio dos trabalhadores. Se era aprovada em assembleia a ação, continuava; caso contrário, não! É muito importante saber o que o trabalhador quer fazer. Assim, em todos esses anos não criei inimizades tanto entre nossos companheiros da base, como com os empresários. Sempre fui respeitado”.

Pra se ter ideia, em 1987, Chicão liderou greve na Bardella, na época com cerca de 2.400 trabalhadores. Ele conta: “Parei a fábrica por 15 dias, em todos eles consultando os trabalhadores e negociando com a empresa. No final tivemos pleno sucesso. Quando achei que era hora de acabar com o movimento, falei aos trabalhadores e eles acataram. Conseguimos 120% de aumento, equiparação salarial e outros itens. A greve acabou. Um diretor da Bardella virou para mim e disse: ‘Você é um artista, porque com um megafone e duas cornetas (de plástico) conseguiu manobrar e controlar 2.400 pessoas!’”

Hoje - Chicão se diz um homem plenamente realizado: “Sempre tive sorte em minha vida. Encontrei a mulher ideal, com quem tive três filhas maravilhosas. Fiz muitos amigos como sindicalista, posso ter criado algumas inimizades também, mas tenho sempre comigo a sensação de dever cumprido. Não gosto de lembrar da política, que na verdade foi uma grande decepção. Gosto de lembrar das boas amizades que fiz”.

Como tristeza nesta longa carreira, Chicão traz duas lembranças: “Primeiro, que eu nunca mais voltei para ver meu pai. Comecei a trabalhar, ele morreu pouco tempo depois e não tive tempo de reencontrá-lo para agradecer tudo que me ensinou na vida. Segundo, a morte de minha mulher mexeu muito comigo. Ela era meu braço direito, estava sempre me apoiando. Agora, continuo fazendo meus bicos e torço para que Deus me dê oportunidade de conhecer um bisneto”.

Recado - O recado deste líder sindical: “Todo trabalhador, que tiver oportunidade, tem que estudar, fazer cursos profissionalizantes e se aperfeiçoar. O mercado está cada vez mais competitivo, com muitos estrangeiros sendo importados para realizar trabalho que compete ao brasileiro. Se não se reciclar e se aprimorar, o trabalhador vai perder espaço para pessoas mais capacitadas”.

Sindicalismo - Outra recomendação: “Nunca deixe de se associar ao Sindicato onde estão pessoas que só pensam no bem-estar do trabalhador e em todos os seus direitos. É importante, acima de tudo, participar das ações por PLR, melhores salários, equiparação, saúde e segurança. Ninguém mais vai lutar com tanto afinco pelos seus direitos do que as pessoas que estão no seu Sindicato”.

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